Manejo racional otimiza imunização do rebanho

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Manejo racional otimiza imunização do rebanho

*Renato dos Santos (*1954 |+2021) – médico-veterinário e consultor em manejo racional 

Vacinar o gado é uma ação necessária na criação animal, seja para atender à legislação como prevenção ou erradicação de algumas doenças, seja para assegurar boas condições de saúde aos animais, minimizando riscos de doenças e consequentes prejuízos econômicos.

 

No entanto, o procedimento de vacinação é, em si, uma prática aversiva, portanto, deve ser realizada de forma racional, de modo que o impacto negativo do manejo não seja tão acentuado para os animais.

 

Grande parte do sucesso da imunização dos animais está no manejo correto para a aplicação da vacina. O manejo racional na vacinação proporciona ganhos em qualidade e produtividade para toda a cadeia. Além de garantir a sanidade do rebanho, chegam ao frigorífico animais com menores índices de perdas por conta da vacinação incorreta e, consequentemente, uma carne superior para o consumidor.

 

Por isso, antes de mais nada, é preciso considerar alguns fatos sobre a aplicação de vacinas com o objetivo de imunizar rebanhos:

 

  1. Aplicar é diferente de imunizar;
  2. O país tem um histórico ruim quanto à aplicação de vacina, com uma perda média de 400g de carne por animal abatido em decorrência de lesões vacinais (pesquisa Moro & Junqueira, 1999);
  3. A conservação de vacinas em fazendas usando a geladeira é de alto risco porque o fornecimento de energia é bastante deficiente;
  4. O percentual de sangramento e refluxo observados no manejo é alto e mostra irresponsabilidade ou desconhecimento por parte dos aplicadores;
  5. As vacinas não têm eficiência de 100%, cabendo então ao homem se aproximar desse objetivo ou se afastar dele;
  6. A legislação prevê que toda aplicação injetável em bovinos deverá ser feita da ponta da paleta ao terço médio do pescoço.

 

Como então ser mais eficientes na vacinação? Uma preparação criteriosa quanto ao planejamento, considerando a compra, o transporte e principalmente a conservação da vacina até a fazenda com o cuidado para que a temperatura fique entre os 2 a 8 graus centígrados, evitando variações de temperatura mesmo nessa faixa, é o começo. Ao receber a vacina na fazenda, deve-se verificar se há gelo, que garante a temperatura e a integridade dos frascos. A vacina jamais deve ficar exposta ao sol.

 

É importante ler o rótulo cuidadosamente, observando indicação, preparação, via de administração (utilizar sempre a via subcutânea havendo indicação, a via intramuscular é mais agressiva), segurança, prazo de validade, dosagem, armazenamento e período de retirada. Anotar em impresso próprio esses dados e arquivar. Lembrar que vacinas liofilizadas contra brucelose terão vida útil de no máximo duas horas após seu preparo.

 

O acondicionamento da vacina na fazenda deverá continuar em caixas térmicas (considerar que caixas de polipropileno permitem melhor higienização que caixas de isopor), principalmente se a queda de energia é acontecimento constante. Os aparelhos (seringas) e as agulhas devem ser higienizados corretamente e assim mantidos durante todo o trabalho. Para tanto, o local de trabalho deve ter ferramentas para realizar essa higienização, como água, sabão e condições de esterilização por fervura de agulhas e componentes da seringa. O intervalo do almoço é um bom momento para fazer a limpeza e a manutenção da seringa, usando sabão e água corrente para lavar.

 

A vacina deverá chegar ao curral na caixa térmica e cada aplicador deve ter sua caixa em menor tamanho, diminuindo o risco de mistura de vacinas e a variação da temperatura da caixa de depósito com muita frequência. Lembrar-se de retirar a água que forma no interior da caixa térmica constantemente, pois essa água contaminada pode entrar na agulha e ser aplicada no animal. O gelo seco é ideal e é distribuído gratuitamente nas lojas de produtos agropecuários. É importante nunca voltar a agulha no frasco depois de usada no animal. Não guardar ou reutilizar as sobras de vacina; elas devem ser descartadas.

 

Agitar o frasco antes de cada recarga é obrigatório. É preciso tomar cuidado para não haver um descuido e misturar vacinas dentro do aparelho se o aplicador estiver com a responsabilidade de aplicar duas vacinas no mesmo manejo.

 

As seringas no mercado são de boa qualidade, porém podem ter problemas de dosagem com facilidade. Para evitar, tire o ar da seringa, já que essa é a maior causa de erros de dosagem e refluxo. Deve-se observar com frequência se a dose está dentro do estabelecido pelo fabricante da vacina.

 

O tamanho e a conservação das agulhas são importantes no processo. Por isso, não tente desentortar ponta de agulha. Não vale a pena, pois elas são baratas. Outra dica para a eficácia da vacinação é a escolha com atenção do calibre e do comprimento da agulha para aplicação de medicamentos no gado. Na aplicação subcutânea, costuma-se usar a agulha 18x10. No entanto, é preciso observar a densidade do líquido e o manejo. Para aplicar uma vacina mais densa com uma agulha comprida e grossa, o animal deve estar bem contido, de forma que o aplicador possa puxar o couro para fazer a perfuração, garantindo que o produto fique mais distante do furo. Para vacinas menos densas e de menor dose, como a contra carbúnculo (2ml a dose), usa-se agulhas mais finas; para febre aftosa, (5ml a dose), agulhas mais grossas. Para produto mais oleoso, a agulha deve ser mais grossa; para aplicação em bezerros, agulhas mais curtas e para animais mais erados, agulha mais comprida.

 

Sem estresse

Para a vacinação, o gado deve ser conduzido ao curral com calma, a passo, evitando qualquer esforço ou estresse, cuidando para que não haja entre os animais a necessidade de disputa por espaço. Deve-se trazer para o curral a quantidade de animais que será trabalhada no período e devolvida ao pasto ainda nesse período. Procurar evitar vacinar em dias de chuva, pois o barro suja os animais e aumenta muito a possibilidade de contaminação, levando à formação de abcessos no local da aplicação.

 

O manejo deve ser sempre em local coberto para evitar a inutilização da vacina. A aplicação do produto deve ser feita no terço médio do pescoço, logo à frente da ponta da paleta. Para isso, o ideal é que o manejo de vacinação seja realizado em troncos de contenção ao invés de brete coletivo, onde os riscos de acidentes com o gado e com os vaqueiros são altos.

 

A aplicação de vacina no brete coletivo colabora para o nervosismo do rebanho, de forma que muitos animais acabam pulando e pisoteando outros mais fracos. Quando isso ocorre, além de machucar o animal, o trabalho precisa ser incessantemente interrompido. Outro aspecto é que a vacinação com o animal contido a laço ou no corredor diminui as chances de eficácia da vacina. O estresse pode provocar aumento de até dois terços na produção de cortisol, impedindo que o sistema imunológico do animal responda adequadamente à vacinação. Soltos no corredor, há ainda o risco de quebra da agulha, perda de equipamentos e de doses, sangramento e refluxo da vacina por causa dos movimentos constantes dos animais. Tudo isso influencia nos gastos finais com a vacinação e nas perdas no frigorífico por lesões vacinais causadas por aplicações incorretas.

 

Assim, a melhor opção é vacinar o gado um a um no tronco de contenção. É bom para o animal, que sofre menos, e para o vaqueiro, que não fica exposto a riscos como chifradas ou coices. É bom ainda para a sanidade animal, já que contribui para a efetiva imunização do rebanho.

 

Mesmo tempo, mais eficiente e mais barato

Diferente do que se pensa, o manejo de vacinação no tronco de contenção leva o mesmo tempo que no brete coletivo, além de ser mais eficiente e barato. A conclusão é do ETCO (Grupo de Estudos e Pesquisas em Etologia e Ecologia Animal), da Unesp/Jaboticabal, coordenado pelo professor Mateus Paranhos da Costa.

 

Segundo o estudo feito pelo ETCO, o tempo médio gasto para vacinação no tronco é menor que o gasto no brete (9,3 segundos contra 10,2 segundos por animal). No brete, as interrupções para socorrer acidentes, como levantar animais que caíram, acabam prolongando o tempo de trabalho.

 

Uma contenção correta, ou seja, a utilização do tronco de contenção individual deve ser considerada na busca de aplicação do produto no local certo e na via certa, o que diminui risco de refluxo e sangramento, evitando-se lesões em partes de carne nobre. A maciez da carne é afetada nas regiões ao redor dos locais das injeções e isso acontece até mesmo quando não se consegue detectar a lesão. A aplicação da vacina em locais impróprios provoca a necessidade de toalete, ou seja, perda de carne.

 

Conclusão

Vacinas fazem parte de um amplo programa de controle e devem ser feitas preventivamente em todo o rebanho. Mesmo se a cultura da pecuária brasileira é de uma veterinária curativa, é preciso ter em mente que a prevenção é mais barata e mais eficiente, mesmo se os resultados mais evidentes são a médio e longo prazo.

 

Da forma como é feita em muitas propriedades, a vacinação é mais um ônus do que um investimento em sanidade animal. Para não jogar dinheiro fora com aplicações errôneas, o produtor deve rever seu manejo e corrigir as falhas na hora da vacinação. A resposta é imediata. Quem parte para a racionalização na lida com o gado não volta atrás.

 

10 dicas para manejo na vacinação

1) Na seringa, procure trabalhar com poucos animais, pois isso facilita a entrada deles no brete. Evite manter os animais por longo tempo nos compartimentos do curral (mangas).

2) Leve os animais ao brete sem correria, gritos ou choques.

3) Não encha o brete a ponto de apertar os animais, nem as mangas, onde os animais

devem ocupar no máximo metade do espaço disponível.

4) Conduza um a um os animais ao tronco de contenção, o que pode ser facilitado com a utilização de bandeiras.

5) Antes de conter o animal com a pescoceira, feche a porteira dianteira do tronco de contenção, e só depois contenha-o com a pescoceira. A utilização da pescoceira para parar os animais, além de machucá-los, diminui a vida útil do tronco de contenção.

6) Conter cada animal na pescoceira, de preferência com o animal já parado e sem golpes. O fechamento das porteiras de entrada e saída também deve ser feito sem pancadas.

7) A equipe de trabalho deve estar bem posicionada: uma pessoa cuida da porteira de entrada e da contenção do posterior do animal (quando necessário) e outra cuida da porteira de saída e da pescoceira. Com o animal contido, um deles realiza a aplicação

da vacina. Com isso, há diminuição do risco de acidentes e menor desgaste dos vaqueiros.

8) No caso de mais de um tipo de vacina ou de aplicação simultânea de vermífugos, é conveniente contar com mais uma pessoa, aplicando os produtos em lados opostos do pescoço do animal.

9) Após a contenção do animal, abra a janela do tronco e proceda à vacinação. Em seguida feche a janela, solte a pescoceira e, só então, abra a porteira dianteira de saída. O ideal é que o animal saia direto em uma manga ou piquete que tenha de água e sombra e, se possível, que encontre ali uma recompensa na forma de alimento (isso pode ser feito a cada lote, ou no caso de lotes muito grandes, a cada 20-30 animais).

10) Ao final do trabalho, faça o possível para passar os animais novamente pela seringa, brete e tronco de contenção (com todas as porteiras abertas), conduzindo-os imediatamente de volta ao pasto.

 

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